Revista geo-paisagem (on line)

Ano  9, nº 18, 2010

Julho/Dezembro  de 2010

ISSN Nº 1677-650 X

Revista indexada ao Latindex

Revista classificada pelo Dursi

 Revista classificada pela CAPES

 

 

 

A geografia brasileira começa aonde? Seria no Colégio Pedro II ?

 

Helio de Araujo Evangelista[1]

 

Abstract  

       

The text aims to search how can we find the beginning of Brazilian geography. In our point of view it’s important to pay attention what occurs at school. So we developed research about the D. Pedro II school. But, it isn’t possible to believe that this institution was responsible for an important task in geography development.

 

Keywords: Brazil, Pedro II school, geography

 

Resumo

 

O artigo pretende encontrar a origem do fomento da disciplina geografia brasileira. Em nosso modo de ver entendemos que devemos considerar a estrutura de ensino, o que nos leva ao colégio Pedro II. Mas, no correr do texto, não nos é possível entender que foi este instituto que ensejou um decisivo papel no aparecimento da geografia.

 

Palavras-chave: Brasil, colégio Pedro II, geografia

 

·         Bate papo

            Era uma tarde no período de férias de julho. Na Sociedade Brasileira de Geografia encontravam-se três personagens cujas idades somadas alcançariam quase trezentos anos. Num dado momento estes passaram a falar do Colégio Pedro II. Todos os três, com trajetórias de vida distintas, mas cada qual com o devido destaque em suas respectivas áreas de atuação passaram a elogiar rasgadamente o colégio. Mauro Viegas, empresário, lembrava de ter sido aluno do internato em 1936. Já o geógrafo Pedro Geiger foi aluno e mais tarde professor. E o advogado Pedro Oliveira foi aluno nos anos de 1943-45.

            Pedro Oliveira lembrara que foi aluno de Hugo Segadas Vianna, assistente do professor Raja Gabaglia, então catedrático de geografia.

            Mauro Viega lembra que João Batista de Mello e Souza foi seu professor de História, sendo ele catedrático. Pedro de Oliveira, por sua vez, lembra do concurso do qual João Batista de Mello e Souza participou e encontrava-se na banca Raja Gabaglia. Este, após a defesa oral do candidato desdenhou o escrito por ter poucas páginas. No que retorquiu o candidato afirmando: não havia no edital indicação de peso que uma tese deveria ter, mas se tivesse certamente eu saberia como fazê-la mais pesada, era só inserir  tabelas, anexos, etc...Acabou sendo aprovado!

            Outro episódio narrado foi a defesa de tese de Pedro Calmon. Na banca, por sua vez, encontrava-se Mello e Souza. Ocorre que o tema do candidato era sobre o viajante Brian Fawcett e por um problema tipográfico duas páginas ficaram em branco. Na oportunidade, durante a defesa, João Batista de Mello Souza retorquiu que ao ler a tese e se deparando com as duas páginas em branco imaginou que haveria ali um código e que o caminho secreto que daria acesso às minas descoberto por Brian Fawcett estaria devidamente expresso naquelas duas páginas. Assim, de forma jocosa, ele teria passado a noite toda tentando reconhecer nas duas páginas o caminho para a fortuna.

            Pedro Calmon, por sua vez, veio a ser reitor da UFRJ e teria sido ele que impediu a invasão da antiga faculdade de Direito pelas forças militares. À época ele impediu a entrada dos militares dizendo: “Aqui só entra quem passou no vestibular”

            Pedro Geiger, por sua vez, assinalou que se formou nos anos 1938/39 e foi aluno de Raja Gabaglia. A rigor, havia dois Raja Gabaglia, sendo que um deles dirigia o colégio. E a geografia que nela ocorria poderia ser dita como moderna. Em que pese não houvesse faculdade em geografia o ensino tinha uma direta influência francesa e era bem avançada.

            Ainda segundo Pedro Geiger, o Rio de Janeiro usufruía de um ensino médio, público, de excelente qualidade. A cidade dispunha do colégio Pedro II, Colégio Militar e o Colégio Normal. E assinala, no Brasil, tanto a esquerda brasileira, quanto a direita, na reflexão sobre o Brasil destacava a materialidade, o crescimento, a proteção de setores, mas não se voltava para a questão da educação. Eram três as grandes bandeiras, a saber, defesa da burguesia nacional, petróleo é nosso, reforma agrária. Assim, quando se deu a massificação do ensino, o governo federal não apostou na qualidade.

            Ainda, foi observado, que um professor catedrático no colégio Pedro II ganhava o mesmo que um professor da Universidade do Brasil, atual UFRJ. Foi citado o caso de Hugo Pinheiro Guimarães que dava aula no colégio Pedro II, na disciplina de biologia, e ainda lecionava ciências médicas na faculdade de medicina da universidade.

            Pelo episódio relatado, certamente prosaico, mas é distintivo do quão importante foi e ainda é o colégio Pedro II.Várias personalidades, várias trajetórias, num mesmo reconhecimento! Qual o segredo deste colégio?

            Porém, para efeito de enquadramento, destacarei o processo inicial da escola.

            Mas antes, qual o vetor analítico que temos?

            Após o período de busca infrutífera no chamado período colonial, quando por esta mesma revista ( Revista geo-paisagem ( on line )) apresentamos quatro artigos, um sobre a questão indígena, questão militar, questão religiosa, e, por fim, a festa, adotamos após tudo isto um novo caminho. O que fizemos até então se mostrou infrutífero porque em que pese as diferentes tentativas nada foi encontrado no período citado que possa ser considerado como a base da formação da geografia brasileira. As viagens, os relatórios, as comissões de demarcação de fronteiras, agentes de governo etc. ; nada e ninguém constituiu algo que tivesse se perpetuado e que pudesse ser por nós considerado o fio condutor de uma elaboração intelectual que ensejou uma elaboração em torno do qual pudéssemos dar o nome de geografia e que tivesse desdobramento até os dias de hoje.

            Porém, tal impressão não ocorre quando adentramos na história da instituição de ensino Colégio Pedro II. Tenho a intenção de aqui testar uma intuição, a de que foi este colégio e não o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro a instituição pela qual a disciplina geografia passou a ser objeto de reflexão. Algo a ser considerado oportunamente. Tal intuição decorre da situação de que no Brasil, durante um bom período, ainda hoje há marcas disto, as instituições eram reféns dos talentos individuais, ou seja, não se perpetuava enquanto decisão de um estado, entidade civil, ou empresa, mas dependia de pessoas para tanto animadas. Assim, o que se quer aqui argumentar que é no jogo da sala de aula, nas perguntas não suficientemente respondidas, nos mapas toscamente mal feitos, nos relatos que levava a platéia a suspender a respiração é que se tem um desenho da construção de uma geografia brasileira.

            A geografia brasileira não tem relação com pesquisa, mas com falação. As pessoas falavam, discutiam, opinavam, escreviam em jornais. Então, esta geografia meio solta, meio mambembe, meio à la música popular brasileira, construída meio que no acaso, teve no colégio Pedro II o primeiro e decisivo chamado à responsabilidade. Ou seja, há de ter mais mapas, mais livros, mais professores. Esta punção pedagógica, esta energia didática, os concursos etc. enfim, tudo aquilo que girará em torno do colégio, desde cedo, solicitará uma sistematização do discurso geográfico brasileiro. E esta dinâmica, em torno da geografia, nunca houve antes no país!

 

·         Origem

Joaquim Manuel de Macedo em sua obra – Um passeio pela cidade do Rio de Janeiro – [2]assim pontuava a origem do colégio:

 

“O ministro Bernardo Pereira de Vasconcelos, na regência do Sr. Pedro de Araújo Lima, atual marques de Olinda, fazendo converter o seminário dos pobres órfãos de S. Joaquim em um grande colégio de instrução secundária, a que deu o nome de Imperial Colégio de Pedro II.. (p. 261)” [3]

“A data do decreto que criou o Imperial Colégio Pedro II é, como já ficou dito, de 2 de dezembro de 1837, dia aniversário natalício de S. M. o Imperador. A inauguração, porém, do colégio somente foi efetuada a 25 de março do ano seguinte.” (p. 262)

“Os primeiros professores nomeados foram: de história natural e ciências físicas, o Sr. Dr. Emilio Joaquim da Silva Maia; de história e geografia, o Sr. Dr. Justiniano José da Rocha; de grego e de retórica, o Sr. Dr. Joaquim Caetano da Silva; do inglês, Diogo Maze: de francês, Francisco Maria Piqueta; de filosofia, o Sr. Dr. Domingos José Gonçalves Magalhães; de latim, o Sr. Jorge Furtado de Mendonça; de desenho, o Sr. Manoel de Araujo Porto-Alegre, de música, o Sr. Januário da Silva Arvelos.” (p. 263)

“No dia 12 de março de 1838 tiveram princípio os exames preparatórios dos alunos que se apresentavam para matricular-se no novo colégio, e esses exames estenderam-se até ao dia 30 do mês seguinte. ... O dia da inauguração do patriótico estabelecimento foi o do aniversário do juramento da constituição do império, e portanto, sob gloriosos auspícios nasceu e começou ele. ... Na manhã do dia 25 de março de 1838, o atual Sr. Marques de Olinda, então regente do Império, e todo o ministério, que se compunha de Bernardo Pereira de Vasconcelos e dos srs. Miguel Calmon Du Pin e Almeida, depois marques de Abrantes, Joaquim José Rodrigues Torres, depois visconde de Itaboraí, Antonio Peregrino Maciel Monteiro (1) e Sebastião do Rego Barros, dirigiram-se ao antigo seminário de S. Joaquim, e no meio de um numeroso concurso de cidadãos assistiram e presidiram às cerimônias de inauguração do Imperial Colégio de Pedro II....A inauguração do colégio precedeu mais de um mês ao começo dos trabalhos de ensino. (p. 263-4)

 

·         O homenageado, D. Pedro II

 

            Para Lilia Moritz Schwarcz em sua obra – As barbas do imperador – a figura do imperado é emblemática dos ditames que cercam a formação nação-Brasil. Logo ao início de sua obra, Lilia indaga:

 

“Afinal, como explicar a permanência, por quase sessenta anos, de uma monarquia rodeada de repúblicas por todos os lados? Como entender o enraizamento de uma realeza Bragança, mas também Bourbon e Habsburgo, em um ambiente tropical, cercado de indígenas, negros e mestiços? A resposta é estranhar o que parece tão natural em nosso compêndios de história. Longe das luxuosas cortes européias, a capital da monarquia brasileira, em 1838, possuía cerca de 37 mil escravos numa população total de 97 mil habitantes, e em 1849, em uma população de 206 mil pessoas, 79 mil cativos. Além disso, 75% dos escravos eram, em média, africanos, dado que indica a importância da população de cor na cidade do Rio de Janeiro. Por outro lado, os grupos indígenas, tão afastados da corte e dizimados de forma bastante sistemática, eram convertidos, porém, em símbolo da monarquia. Distantes enquanto realidade, ganhavam vida na representação: nos quadros e alegorias, nas esculturas e nos títulos de nobreza.” (2008, p. 13)

 

            Lilia argutamente destaca que o Brasil desde um bom tempo é marcado pela presença de reis, reis africanos, que para aqui foram enviados por força do tráfico; logo, aí reside a argúcia, ...”Essa convivência entre tantos reis –imaginários ou não – permitia o surgimento de compreensões diferentes da realeza e mesmo de certa recepção positiva da monarquia.” (Ibidem, p. 14-15) Havia uma interação, em que pese não democrática, mas uma interação assídua entre as partes que envolvia plurais, inclusive os santos. (Ibidem, p. 16)

            Este Brasil múltiplo, imenso enseja espectros sem os quais é inviável compreender o país, e por tabela a própria geografia.

            Lilia indaga:

“...o que significa inventar uma corte em território americano, buscar todas as regras na mais fiel tradição medieval européia, mas adotar nomes e títulos indígenas? Como explicar um príncipe que se veste com o rigor majestático das grandes cortes, porém introduz uma murça de penas de papo de tucano, tal qual um cacique, e um manto com ramos de café e tabaco? O que dizer da famosa Fazenda de Santa Cruz, tirada dos jesuítas quando de sua expulsão e protegida pelos monarcas portugueses aqui residentes, que agrupava um número elevado de escravos-cantores de música sacra? De que maneira entender um imperador que sentava na frente dos estantes brasileiros das exposições universais – verdadeiras festas de exibição dos feitos tecnológicos e industriais das nações capitalistas – e exibia sua coroa ao lado de produtos indígenas e da arte popular?” (Ibidem, p. 17)

 

            Este caráter colmatado e plural. Numa espécie de saudável balbúrdia simbólica, mas que ao fim e ao cabo cristalizou um claro eixo de poder no Brasil não foi, ao ser estabelecido a República, devidamente reconstruído. Durante um bom período a chamada república brasileira passou por graves desalinhos. Inclusive, como destaca Lilia, esta república toma vulto na história pagando um tributo a este passado imperial, por exemplo, tanto o hino nacional, quanto a bandeira, têm por matriz bases monárquicas! (Ibidem, p. 18-20) 

 

D. Pedro II e seu colégio – Eu só governo duas coisas no Brasil: a minha casa e o Colégio Pedro II” ou “Se não fosse imperador do Brasil quisera ser mestre-escola”

 

            Tais epígrafes, tiradas da obra de Lilia (2008, p. 150-1) assinalam o grau de predileção que o colégio tinha dentro de suas ocupações. O colégio era D. Pedro II. Cabe destacar que então vivíamos quando as instituições brasileiras antes de serem arranjos decorrentes de um processo laborativo, marcado por consultas, discussões e deliberações, eram expressões, encarnações de personalidades. E o colégio Pedro II era uma expressão da carne do imperador que lhe era mais caro, a saber, um lugar da instrução que tem um benemérito sobejamente erudito. Tal pai, tal filho.

            O colégio Pedro II é a extensão do imperador na estrutura de poder naquilo que lhe era mais caro em sua trajetória enquanto monarca, alguém que promovia a clarividência. 

            Porém, em que pese todo este endosso, a abrangência do colégio se reduzia à cidade do Rio de Janeiro. Só com os anos, numa longa história, o colégio torna-se matriz brasileira do que vem a ser educação! (Ibidem, p. 155)

 

·         Os catedráticos

            Ainda em meados do século XX, o nível salarial do professor universitário da Universidade do Brasil, Rio de Janeiro, se equiparava ao catedrático do colégio Pedro II. Não raro, o professor lecionava na universidade e no colégio, como já observado.

            A ambiência científica no Brasil começa também na sala de aula. As carreiras científicas, também, começam na sala de aula. Um país tão rico em sua oralidade, tendo nítido efeito no campo musical, certamente não deixou de afetar o campo científico brasileiro. Neste sentido, o colégio Pedro II teve um papel primoroso, por tabela, na própria geografia.

            Segue abaixo uma relação dos primeiros catedráticos da área de geografia e história obtida junto ao Núcleo de Documentação e Memória – NUDOM.

 

Nome

Disciplina

Período

Dr. Justiniano José da Rocha

geografia

1838

Conego Dr. Marcelino José de Ribeiro Silva Bueno

Geografia e história

1840

João Baptista Calógeras

Geografia e história

1847

Dr. Joaquim Manoel de Macedo

Corografia e história do Brasil

1849

Frei Camilo de Monserrat

Geografia e história

1840

João Antonio Gonçalves da Silva

História geral e geografia

1855

Pedro José de Abreu

Geografia (só)

1858

Dr. Francisco José Xavier

s/d

1879

João Capistrano de Abreu

Corografia e história do Brasil

1883

João Maria da Gama Berqui

Geografia e história

1891

Dr. João Coelho Gonçalo Lisboa

Geografia (só)

1891

Dr. Augusto Daniel de Araujo Lima

s/d

1894

Luiz Candido Paranhos Macedo

s/d

1911

Dr. Fernando Antonio Raja Gabaglia

s/d

1918

Dr. Honório de Souza Silvestre

s/d

1918

O próximo catedrático só ocorreria em 1950

 

            No período de 1838 à 1950 o colégio contou com 170 catedráticos. Sendo que catedrático em geografia, apenas, só contamos sete, menos que catedrático em francês que chegou a ter dez! Para efeito comparativo, catedráticos com número respectivo tivemos: inglês (12), alemão (11), latim (16) e matemática (14).

            Enfim, a geografia tinha uma importância mas não se é possível dimensionar a ideia de que a geografia conformaria o aparelho conceitual pelo qual o estado em ascensão privilegiaria. No caso brasileiro, à época, este aparelho conceitual é mix.

            Nos é forçoso concordar com Genylton Rocha quando observa em sua dissertação:

 

“Nem uma evidência nos faz pensar que ao ser inserida no Brasil, quando datransplantação” do modelo curricular francês realizada nas primeiras décadas do século passado, o ensino desta disciplina tenha inicialmente tido aqui outra finalidade que não fosse a de fornecer informações genéricas, verdadeiramente enciclopédicas, de um mundo em franco processo de expansão. Lembremos que também o nosso curso secundário tinha um nítido caráter de formação geral.” (1996, p. 153)

            Enfim, não havia geografia! Havia um diletantismo, uma certa forma rebuscada de falar do Brasil. Um certo galanteio nas descrições, como se lá tivesse estado mas que nunca passou dos umbrais da própria cidade do Rio de Janeiro.

            Era a geografia da perfumaria! Uma geografia muito mais dada aos salões. A certas curiosidades, ou até mesmo inconfidências, mas nada, absolutamente nada, fruto de um projeto de reconhecimento, fruto de pessoas que vieram a andar, ao menos, por este país. Até este momento o Brasil ignorava a si e a geografia então ensinada expressava isto.

            No lugar de maior excelência no que tange à formação de quadros de tenra idade, no caso, colégio Pedro II, não temos uma geografia inocente, uma geografia pueril que simplesmente não deixou marca.

            Se temos por exemplo, a produção historiográfica, destacando Varnhagem e Capistrano de Abreu a seguir, ensejamos já no século XIX uma maneira de se reconhecer o país a partir de suas respectivas penas. Mas qual o geógrafo que teria deixado igual impressão no campo geográfico?

 

·         Comissão científica do Império[4]

 

            Até meados do século XIX alguns estrangeiros percorreram e descreveram o Brasil, tais como Auguste de Saint-Hilaire (1816-1822), Von Martius e Spix (1817-1820) e Langsdorff e Florence (1824-1829). Porém, em 1859 tivemos o início da primeira expedição em direção ao interior brasileiro promovida por brasileiros!

            Porém, desta aventura pouco nos resta em termos de relatórios. O trabalho veio a ser finalizado em 1861 mas a divulgação dos resultados foi muito irregular por parte daquele órgão que foi o seu fomentador, a saber, Instituto Histórico Geográfico Brasileiro.

            A rigor, o que parece indicar, tendo em conta o material não divulgado da Comissão, é que esta tinha um único endereço, a saber, satisfazer uma única pessoa, no caso, o Imperador. A ele cabia tão somente apresentar o que se tinha descoberto. A rigor, a este tempo, o Brasil é ele!

            Houve partido? Houve projeto? Houve livro?

            - Não, nada!

            O esforço foi para ele, foi para o imperador!  Mas, o que se tirou disso?

            - Um imperador mais sábio!

            Em resumo, um completo divórcio, a este tempo, de qualquer ciência e sua articulação com a estrutura de ensino do país, particularmente, no colégio Pedro II.

            De certo modo houve alguns efeitos neste colégio, porque quem do colégio estava na comissão, ou quem do colégio freqüentava o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro. Cabe reparar na equipe que participava da expedição, a saber:

 

A comissão foi composta principalmente por pesquisadores do Museu Imperial e membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Dividida em cinco seções, tinha como presidente e chefe da Seção de Botânica o médico e naturalista, Dr. Francisco Freire Alemão. Respondia pela Seção de Geologia e Mineralogia o Dr. Guilherme Schuch de Capanema, engenheiro, adjunto da Divisão de Geologia e Mineralogia do Museu Imperial. A Zoologia ficou sob o comando do Dr. Manuel Ferreira Lagos, do Museu Imperial e do Instituto Histórico. A Seção Astronômica e Geográfica foi confiada ao matemático Giacomo Raja Gabaglia, ente da Academia da Marinha, e, por fim, a Etnografia, sob o encargo de Antonio Gonçalves Dias, poeta e professor de história e latim do Colégio Pedro II. Para a ilustração científica e paisagística ficou encarregado o professor de desenho da Escola da Marinha e ex-aluno de Debret, José dos Reis Carvalho. (Kury, 2009, p.23)

 

            Por fim, terminamos aqui! Valha a pena, à semelhança de Joaquim Manuel de Macedo em seu - Um passeio pela cidade do Rio de Janeiro – termos um pouso, no caso, o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, seja para melhor conhecermos a circunstância da comissão acima, mas particularmente atentarmos para a origem da geografia enquanto disciplina no Brasil.

 

Conclusão

 

            A esse tempo, 1838, não havia geografia brasileira porque simplesmente não havia Brasil.

            Esta idéia Brasil, que nos parece tão natural, com limites, árvores e mapas, não existia ainda a este tempo. Havia algo que não tinha bandeira, não tinha hino. Não tinha moeda própria, não tinha partido próprio, enfim, era algo sem projeto, assim, como esperar daqueles que se debruçavam de nossa realidade tivessem clarividência de que o Brasil viria a existir, e não um Brasil todo dividido tal como ocorreu com a América Espanhola!

            Vamos ao IHGB, que é justamente uma tentativa de ser o espelho deste país.

            Por ora, podemos afirmar que a geografia de sala de aula apresentava pouca serventia. Seja para os alunos, para os professores, para o Estado, para o Exército... Tudo isto ao menos na primeira metade do século XIX!

            Enfim, o texto começa de um modo e termina de outro. Vale a pena continuarmos a investigação ... onde começa a geografia brasileira?

            Se alguém lê esta linhas com um sorriso irônico por já deter a resposta, sinceramente, faço minha a máxima do poeta florentino: Segue il tuo corso, e lascia dir le genti!

 

 

Fontes de dados

 

Bibliografia

 

ALI, M. Said. Compedio de geografia elementar. s/d (obra rara) acervo Nucleo de Documentação e Memória do colégio Pedro II – NUDOM.

 

CALÓGERAS, J. Pandiá . Formação histórica do Brasil. 8ª edição. São Paulo: Ed. Nacional, 1980.

 

CARVALHO, Delgado . O atlântico sul. 1922. s/d (obra rara) acervo Nucleo de Documentação e Memória do colégio Pedro II – NUDOM.

 

CARVALHO, José Murilo de . A construção da ordem: a elite imperial. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1981.

 

DORIA, Escragnole – Memória histórica do colégio de Pedro Segundo (1837-1937). Comissão de atualização da memória histórica do colégio Pedro II, Brasília: Instituto Nacional de Estudo e Pesquisa Educacional, 1991.

 

FREYRE, Gilberto. Ordem e progresso. Rio de Janeiro: Ed. Record, 2000.

 

KURY, Lorelai (org.) – Comissão científica do império. Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estudio Editorial Ltda. 2009.

 

LIMA, Oliveira. Formação histórica da nacionalidade brasileira. 3ª edição. Rio de Janeiro: Topbooks ; São Paulo: Publifolha, 2000.

 

MACEDO, Joaquim Manuel de Macedo. Livros de corografia do Brasil. Rio de Janeiro, livraria Garnier, 1877, 1 e 2 vol. (obra rara) acervo Nucleo de Documentação e Memória do colégio Pedro II – NUDOM.

_________ Um passeio pela cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1966.

 

MATTOS, Ilmar Rohloff de . O tempo de saquarema. A formação do estado imperial. Rio de Janeiro: Access, 1994.

 

ROCHA, Genylton Odilon Rego da Rocha. A trajetória da disciplina geografia no currículo escolar brasileiro (1837-1942). Dissertação de mestrado orientada por Ana Maria Saul e defendida no programa de pós-graduação em educação na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1996.

 

SANTOS, Arnaldo Ferreira dos Santos. Reminiscências de um ex-aluno do colégio Pedro II, de um médico da UFRJ nascido no morro do Alemão. “Peitudo Caburé”. Rio de Janeiro: Ed. Achiamé, 2007. 

 

SCHWARCZ, Lilia Moritz  . As barbas do imperador. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

 

Documentos

 

Núcleo de Documentação e Memória do colégio Pedro II – NUDOM

 

Programa de ensino da escola secundária  brasileira (1850-1951). Orgs. Anclê Vechic & Karl Michael Lorenz . Ed. Do autor.

 

Decreto de fundação do colégio Pedro II. Colégio Pedro II, Anuário do Colégio Pedro II. Rio de Janerio, Typ. Revista dos tribunais, 1914, 314 p. , PP. 44-5.

 

 

Volta

 



[1] Prof. Dr. do Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense. Email helioevangelista@hotmail.com

 

[2] Obra publicada pelo autor nos anos de 1862-1863, e editada pela editora Edições de Ouro em 1966). Sendo ele também ao tempo da primeira publicação professor do Colégio Pedro II. Seu trabalho mais conhecido ficou conhecido como – A moreninha.

 

[3] A caracterização do Seminário dedicado a órfãos que veio a ser substituído pelo colégio foi exaustivamente realizada pelo referido autor nas seguintes páginas de sua obra p. 235-261. Trata-se de um seminário cuja história remonta à primeira metade do século XVIII.

 

[4] As observações que se seguem foram encontradas na obra – Comissão científica do Império – organizada por Lorelai Kury (2009).