Revista geo-paisagem (on line) Ano 9, nº 18, 2010 Julho/Dezembro de 2010 ISSN Nº 1677-650 X Revista indexada ao Latindex Revista classificada pelo Dursi Revista classificada pela CAPES |
A geografia brasileira começa aonde? Seria no Colégio Pedro II ?
Helio
de Araujo Evangelista[1]
Abstract
The text aims to search how can we find the beginning of Brazilian geography. In our point of view it’s important to pay attention what occurs at school. So we developed research about the D. Pedro II school. But, it isn’t possible to believe that this institution was responsible for an important task in geography development.
Keywords: Brazil, Pedro II school, geography
Resumo
O artigo pretende encontrar a origem do fomento da disciplina geografia brasileira. Em nosso modo de ver entendemos que devemos considerar a estrutura de ensino, o que nos leva ao colégio Pedro II. Mas, no correr do texto, não nos é possível entender que foi este instituto que ensejou um decisivo papel no aparecimento da geografia.
Palavras-chave:
Brasil, colégio Pedro II, geografia
·
Bate papo
Era uma tarde no período de férias
de julho. Na Sociedade Brasileira de Geografia encontravam-se três personagens
cujas idades somadas alcançariam quase trezentos anos. Num dado momento estes
passaram a falar do Colégio Pedro II. Todos os três, com trajetórias de vida
distintas, mas cada qual com o devido destaque em suas respectivas áreas de
atuação passaram a elogiar rasgadamente o colégio. Mauro Viegas,
empresário, lembrava de ter sido aluno do internato em 1936. Já o geógrafo
Pedro Geiger foi aluno e mais tarde professor. E o
advogado Pedro Oliveira foi aluno nos anos de 1943-45.
Pedro Oliveira lembrara que foi
aluno de Hugo Segadas Vianna, assistente do professor Raja Gabaglia, então
catedrático de geografia.
Mauro Viega
lembra que João Batista de Mello e Souza foi seu professor de História, sendo
ele catedrático. Pedro de Oliveira, por sua vez, lembra do concurso do qual
João Batista de Mello e Souza participou e encontrava-se na banca Raja
Gabaglia. Este, após a defesa oral do candidato desdenhou o escrito por ter
poucas páginas. No que retorquiu o candidato afirmando: não havia no edital
indicação de peso que uma tese deveria ter, mas se tivesse certamente eu saberia
como fazê-la mais pesada, era só inserir tabelas, anexos, etc...Acabou sendo
aprovado!
Outro episódio narrado foi a defesa de tese de Pedro Calmon. Na banca, por sua vez,
encontrava-se Mello e Souza. Ocorre que o tema do candidato era sobre o
viajante Brian Fawcett e
por um problema tipográfico duas páginas ficaram em branco. Na oportunidade, durante
a defesa, João Batista de Mello Souza retorquiu que ao ler a tese e se
deparando com as duas páginas em branco imaginou que haveria ali um código e
que o caminho secreto que daria acesso às minas descoberto por Brian Fawcett estaria devidamente
expresso naquelas duas páginas. Assim, de forma jocosa, ele teria passado a
noite toda tentando reconhecer nas duas páginas o caminho para a fortuna.
Pedro Calmon, por sua vez, veio a
ser reitor da UFRJ e teria sido ele que impediu a invasão da antiga faculdade
de Direito pelas forças militares. À época ele impediu a entrada dos militares
dizendo: “Aqui só entra quem passou no vestibular”
Pedro Geiger,
por sua vez, assinalou que se formou nos anos 1938/39 e foi aluno de Raja
Gabaglia. A rigor, havia dois Raja Gabaglia, sendo que
um deles dirigia o colégio. E a geografia que nela ocorria poderia ser dita
como moderna. Em que pese não houvesse faculdade em geografia o ensino tinha
uma direta influência francesa e era bem avançada.
Ainda segundo Pedro Geiger, o Rio de Janeiro usufruía de
um ensino médio, público, de excelente qualidade. A cidade dispunha do colégio
Pedro II, Colégio Militar e o Colégio Normal. E assinala, no Brasil, tanto a esquerda brasileira, quanto a direita, na reflexão sobre o Brasil
destacava a materialidade, o crescimento, a proteção de setores, mas não
se voltava para a questão da educação. Eram três as grandes bandeiras, a saber,
defesa da burguesia nacional, petróleo é nosso,
reforma agrária. Assim, quando se deu a massificação
do ensino, o governo federal não apostou na qualidade.
Ainda, foi observado, que um
professor catedrático no colégio Pedro II ganhava o mesmo que um professor da
Universidade do Brasil, atual UFRJ. Foi citado o caso de Hugo Pinheiro
Guimarães que dava aula no colégio Pedro II, na disciplina de biologia, e ainda
lecionava ciências médicas na faculdade de medicina da universidade.
Pelo episódio relatado, certamente
prosaico, mas é distintivo do quão importante foi e ainda é o colégio Pedro II.Várias personalidades, várias trajetórias, num mesmo
reconhecimento! Qual o segredo deste colégio?
Porém, para efeito de enquadramento,
destacarei o processo inicial da escola.
Mas antes, qual o vetor analítico
que temos?
Após o período de busca infrutífera
no chamado período colonial, quando por esta mesma revista ( Revista
geo-paisagem ( on line )) apresentamos quatro artigos, um sobre a questão
indígena, questão militar, questão religiosa, e, por fim, a festa, adotamos
após tudo isto um novo caminho. O que fizemos até então se mostrou infrutífero
porque em que pese as diferentes tentativas nada foi encontrado no período
citado que possa ser considerado como a base da formação da geografia
brasileira. As viagens, os relatórios, as comissões de demarcação de
fronteiras, agentes de governo etc. ; nada e ninguém
constituiu algo que tivesse se perpetuado e que pudesse ser por nós considerado
o fio condutor de uma elaboração intelectual que ensejou uma elaboração em
torno do qual pudéssemos dar o nome de geografia e que tivesse desdobramento
até os dias de hoje.
Porém, tal impressão não ocorre
quando adentramos na história da instituição de ensino Colégio Pedro II. Tenho a
intenção de aqui testar uma intuição, a de que foi este colégio e não o
Instituto Histórico Geográfico Brasileiro a instituição pela qual a disciplina
geografia passou a ser objeto de reflexão. Algo a ser considerado oportunamente.
Tal intuição decorre da situação de que no Brasil, durante um bom período,
ainda hoje há marcas disto, as instituições eram reféns dos talentos
individuais, ou seja, não se perpetuava enquanto decisão de um estado, entidade
civil, ou empresa, mas dependia de pessoas para tanto animadas. Assim, o que se
quer aqui argumentar que é no jogo da sala de aula, nas perguntas não
suficientemente respondidas, nos mapas toscamente mal feitos, nos relatos que
levava a platéia a suspender a respiração é que se tem um desenho da construção
de uma geografia brasileira.
A geografia brasileira não tem
relação com pesquisa, mas com falação. As pessoas falavam, discutiam, opinavam,
escreviam em jornais. Então, esta geografia meio solta, meio mambembe, meio à la música
popular brasileira, construída meio que no acaso, teve no colégio Pedro II o
primeiro e decisivo chamado à responsabilidade. Ou seja, há de ter mais mapas,
mais livros, mais professores. Esta punção pedagógica, esta energia didática,
os concursos etc. enfim, tudo aquilo que girará em torno do colégio, desde
cedo, solicitará uma sistematização do discurso geográfico brasileiro. E esta
dinâmica, em torno da geografia, nunca houve antes no país!
·
Origem
Joaquim
Manuel de Macedo em sua obra – Um passeio pela cidade do Rio de Janeiro –
[2]assim
pontuava a origem do colégio:
“O
ministro Bernardo Pereira de Vasconcelos, na regência do Sr. Pedro de Araújo
Lima, atual marques de Olinda, fazendo converter o seminário dos pobres órfãos
de S. Joaquim em um grande colégio de instrução secundária, a que deu o nome de
Imperial Colégio de Pedro II.. (p. 261)”
[3]
“A
data do decreto que criou o Imperial Colégio Pedro II é, como já ficou dito, de
2 de dezembro de 1837, dia aniversário natalício de S.
M. o Imperador. A inauguração, porém, do colégio somente foi efetuada a 25 de
março do ano seguinte.” (p. 262)
“Os
primeiros professores nomeados foram: de história natural e ciências físicas, o
Sr. Dr. Emilio Joaquim da Silva Maia; de história e geografia, o Sr. Dr.
Justiniano José da Rocha; de grego e de retórica, o Sr. Dr. Joaquim Caetano da Silva;
do inglês, Diogo Maze: de francês, Francisco Maria
Piqueta; de filosofia, o Sr. Dr. Domingos José Gonçalves Magalhães; de latim, o
Sr. Jorge Furtado de Mendonça; de desenho, o Sr. Manoel de Araujo
Porto-Alegre, de música, o Sr. Januário da Silva Arvelos.” (p. 263)
“No
dia 12 de março de 1838 tiveram princípio os exames preparatórios dos alunos
que se apresentavam para matricular-se no novo colégio, e esses exames
estenderam-se até ao dia 30 do mês seguinte. ... O dia
da inauguração do patriótico estabelecimento foi o do aniversário do juramento
da constituição do império, e portanto, sob gloriosos auspícios nasceu e
começou ele. ... Na manhã do dia 25 de março de 1838, o atual Sr. Marques de
Olinda, então regente do Império, e todo o ministério, que se compunha de
Bernardo Pereira de Vasconcelos e dos srs. Miguel Calmon Du
Pin e Almeida, depois marques de Abrantes, Joaquim
José Rodrigues Torres, depois visconde de Itaboraí, Antonio Peregrino Maciel
Monteiro (1) e Sebastião do Rego Barros, dirigiram-se ao antigo seminário de S.
Joaquim, e no meio de um numeroso concurso de cidadãos assistiram e presidiram
às cerimônias de inauguração do Imperial Colégio de Pedro II....A inauguração
do colégio precedeu mais de um mês ao começo dos trabalhos de ensino. (p.
263-4)
·
O homenageado, D. Pedro
II
Para Lilia Moritz
Schwarcz em sua obra – As barbas do imperador – a
figura do imperado é emblemática dos ditames que cercam a formação
nação-Brasil. Logo ao início de sua obra, Lilia indaga:
“Afinal,
como explicar a permanência, por quase sessenta anos, de uma monarquia rodeada
de repúblicas por todos os lados? Como entender o enraizamento
de uma realeza Bragança, mas também Bourbon e Habsburgo,
em um ambiente tropical, cercado de indígenas, negros e
mestiços? A resposta é estranhar o que parece tão natural em nosso
compêndios de história. Longe das luxuosas cortes européias, a capital da
monarquia brasileira, em 1838, possuía cerca de 37 mil escravos numa população
total de 97 mil habitantes, e em 1849, em uma população de 206 mil pessoas, 79
mil cativos. Além disso, 75% dos escravos eram, em média, africanos, dado que
indica a importância da população de cor na cidade do Rio de Janeiro. Por outro
lado, os grupos indígenas, tão afastados da corte e dizimados de forma bastante
sistemática, eram convertidos, porém, em símbolo da monarquia. Distantes
enquanto realidade, ganhavam vida na representação: nos quadros e alegorias,
nas esculturas e nos títulos de nobreza.” (2008, p. 13)
Lilia argutamente destaca que o
Brasil desde um bom tempo é marcado pela presença de reis, reis africanos, que
para aqui foram enviados por força do tráfico; logo, aí reside a argúcia, ...”Essa convivência entre tantos reis –imaginários ou não
– permitia o surgimento de compreensões diferentes da realeza e mesmo de certa
recepção positiva da monarquia.” (Ibidem, p. 14-15)
Havia uma interação, em que pese não democrática, mas uma interação assídua
entre as partes que envolvia plurais, inclusive os santos. (Ibidem, p. 16)
Este Brasil
múltiplo, imenso enseja espectros sem os quais é inviável compreender o
país, e por tabela a própria geografia.
Lilia indaga:
“...o
que significa inventar uma corte em território americano, buscar todas as
regras na mais fiel tradição medieval européia, mas adotar nomes e títulos
indígenas? Como explicar um príncipe que se veste com o rigor majestático das
grandes cortes, porém introduz uma murça de penas de
papo de tucano, tal qual um cacique, e um manto com ramos de café e tabaco? O
que dizer da famosa Fazenda de Santa Cruz, tirada dos jesuítas quando de sua
expulsão e protegida pelos monarcas portugueses aqui residentes, que agrupava
um número elevado de escravos-cantores de música
sacra? De que maneira entender um imperador que sentava na frente dos estantes
brasileiros das exposições universais – verdadeiras festas de exibição dos
feitos tecnológicos e industriais das nações capitalistas – e exibia sua coroa
ao lado de produtos indígenas e da arte popular?” (Ibidem, p. 17)
Este caráter colmatado
e plural. Numa espécie de saudável balbúrdia simbólica, mas que ao fim e ao
cabo cristalizou um claro eixo de poder no Brasil não foi, ao ser estabelecido a República, devidamente reconstruído. Durante um bom
período a chamada república brasileira passou por graves desalinhos. Inclusive,
como destaca Lilia, esta república toma vulto na história pagando um tributo a
este passado imperial, por exemplo, tanto o hino nacional, quanto a bandeira, têm por matriz bases monárquicas! (Ibidem, p.
18-20)
D. Pedro II e seu colégio – “ Eu só governo duas coisas no Brasil: a minha casa e o
Colégio Pedro II” ou
“Se não fosse imperador do Brasil quisera ser mestre-escola”
Tais epígrafes, tiradas da obra de
Lilia (2008, p. 150-1) assinalam o grau de predileção que o colégio tinha
dentro de suas ocupações. O colégio era D. Pedro II. Cabe destacar que então
vivíamos quando as instituições brasileiras antes de serem arranjos decorrentes
de um processo laborativo, marcado por consultas,
discussões e deliberações, eram expressões, encarnações de personalidades. E o
colégio Pedro II era uma expressão da carne do imperador que lhe era mais caro,
a saber, um lugar da instrução que tem um benemérito sobejamente erudito. Tal
pai, tal filho.
O colégio Pedro II é a extensão do
imperador na estrutura de poder naquilo que lhe era mais caro em sua trajetória
enquanto monarca, alguém que promovia a
clarividência.
Porém, em que pese todo este endosso, a abrangência do colégio se reduzia à cidade do Rio de Janeiro. Só com os anos, numa longa história, o colégio torna-se matriz brasileira do que vem a ser educação! (Ibidem, p. 155)
·
Os catedráticos
Ainda em meados do século XX, o
nível salarial do professor universitário da Universidade do Brasil, Rio de
Janeiro, se equiparava ao catedrático do colégio Pedro II. Não raro, o
professor lecionava na universidade e no colégio, como já observado.
A ambiência científica no Brasil
começa também na sala de aula. As carreiras científicas, também, começam na
sala de aula. Um país tão rico em sua oralidade, tendo nítido efeito no campo
musical, certamente não deixou de afetar o campo científico brasileiro. Neste
sentido, o colégio Pedro II teve um papel primoroso, por tabela, na própria
geografia.
Segue abaixo uma relação dos
primeiros catedráticos da área de geografia e história obtida junto ao Núcleo
de Documentação e Memória – NUDOM.
Nome |
Disciplina |
Período |
Dr. Justiniano José da Rocha |
geografia |
1838 |
Conego
Dr. Marcelino José de Ribeiro Silva Bueno |
Geografia e história
|
1840 |
João Baptista Calógeras |
Geografia e história
|
1847 |
Dr. Joaquim Manoel de Macedo |
Corografia
e história do Brasil |
1849 |
Frei Camilo de Monserrat |
Geografia e história
|
1840 |
João Antonio Gonçalves da Silva |
História geral e geografia
|
1855 |
Pedro José de Abreu |
Geografia (só) |
1858 |
Dr. Francisco José Xavier
|
s/d |
1879 |
João Capistrano de Abreu
|
Corografia
e história do Brasil |
1883 |
João Maria da Gama Berqui |
Geografia e história
|
1891 |
Dr. João Coelho Gonçalo Lisboa |
Geografia (só) |
1891 |
Dr. Augusto Daniel de Araujo Lima |
s/d |
1894 |
Luiz Candido Paranhos Macedo |
s/d
|
1911 |
Dr. Fernando Antonio Raja Gabaglia |
s/d
|
1918 |
Dr. Honório de Souza Silvestre |
s/d
|
1918 |
O próximo catedrático só ocorreria
em 1950 |
No período de 1838 à 1950 o colégio contou com 170 catedráticos. Sendo que
catedrático em geografia, apenas, só contamos sete, menos que catedrático em
francês que chegou a ter dez! Para efeito comparativo,
catedráticos com número respectivo tivemos: inglês (12), alemão (11),
latim (16) e matemática (14).
Enfim, a geografia tinha uma
importância mas não se é possível dimensionar a ideia de que a geografia conformaria o aparelho conceitual
pelo qual o estado em ascensão privilegiaria. No caso brasileiro, à época, este
aparelho conceitual é mix.
Nos é forçoso concordar com Genylton Rocha quando observa em sua dissertação:
“Nem
uma evidência nos faz pensar que ao ser inserida no Brasil, quando da “transplantação” do modelo curricular francês realizada nas
primeiras décadas do século passado, o ensino desta disciplina tenha
inicialmente tido aqui outra finalidade que não fosse a de fornecer informações
genéricas, verdadeiramente enciclopédicas, de um mundo em franco processo de
expansão. Lembremos que também o nosso curso secundário tinha um nítido caráter
de formação geral.” (1996, p. 153)
Enfim, não havia geografia! Havia um
diletantismo, uma certa forma rebuscada de falar do Brasil. Um certo galanteio
nas descrições, como se lá tivesse estado mas que
nunca passou dos umbrais da própria cidade do Rio de Janeiro.
Era a geografia da perfumaria! Uma
geografia muito mais dada aos salões. A certas curiosidades, ou até mesmo
inconfidências, mas nada, absolutamente nada, fruto de um projeto de
reconhecimento, fruto de pessoas que vieram a andar, ao menos, por este país.
Até este momento o Brasil ignorava a si e a geografia então ensinada expressava
isto.
No lugar de maior excelência
no que tange à formação de quadros de tenra idade, no caso, colégio
Pedro II, não temos uma geografia inocente, uma geografia pueril que
simplesmente não deixou marca.
Se temos
por exemplo, a produção historiográfica, destacando Varnhagem
e Capistrano de Abreu a seguir, ensejamos já no século XIX uma maneira de se
reconhecer o país a partir de suas respectivas penas. Mas qual o geógrafo que
teria deixado igual impressão no campo geográfico?
·
Comissão científica do Império[4]
Até meados do século XIX alguns
estrangeiros percorreram e descreveram o Brasil, tais como Auguste de Saint-Hilaire (1816-1822), Von Martius
e Spix (1817-1820) e Langsdorff
e Florence (1824-1829). Porém, em 1859 tivemos o
início da primeira expedição em direção ao interior brasileiro promovida por
brasileiros!
Porém, desta aventura pouco nos
resta em termos de relatórios. O trabalho veio a ser finalizado em 1861 mas a divulgação dos resultados foi muito irregular por
parte daquele órgão que foi o seu fomentador, a saber, Instituto Histórico
Geográfico Brasileiro.
A rigor, o que parece indicar, tendo
em conta o material não divulgado da Comissão, é que esta tinha um único
endereço, a saber, satisfazer uma única pessoa, no caso,
o Imperador. A ele cabia tão somente apresentar o que se tinha descoberto. A
rigor, a este tempo, o Brasil é ele!
Houve partido? Houve projeto? Houve
livro?
- Não, nada!
O esforço foi para ele, foi para o
imperador! Mas, o que se tirou disso?
- Um imperador mais sábio!
Em resumo, um completo divórcio, a
este tempo, de qualquer ciência e sua articulação com a estrutura de ensino do
país, particularmente, no colégio Pedro II.
De certo modo houve alguns efeitos
neste colégio, porque quem do colégio estava na comissão, ou quem do colégio
freqüentava o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro. Cabe reparar na equipe
que participava da expedição, a saber:
A
comissão foi composta principalmente por pesquisadores do Museu Imperial e
membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Dividida em cinco
seções, tinha como presidente e chefe da Seção de Botânica o médico e
naturalista, Dr. Francisco Freire Alemão. Respondia pela Seção de Geologia e
Mineralogia o Dr. Guilherme Schuch de Capanema,
engenheiro, adjunto da Divisão de Geologia e Mineralogia do Museu Imperial. A
Zoologia ficou sob o comando do Dr. Manuel Ferreira Lagos, do Museu Imperial e
do Instituto Histórico. A Seção Astronômica e Geográfica foi confiada ao
matemático Giacomo Raja Gabaglia, ente da Academia da
Marinha, e, por fim, a Etnografia, sob o encargo de Antonio Gonçalves Dias,
poeta e professor de história e latim do Colégio Pedro II. Para a ilustração
científica e paisagística ficou encarregado o professor de desenho da Escola da
Marinha e ex-aluno de Debret, José dos Reis Carvalho.
(Kury, 2009, p.23)
Por fim, terminamos aqui! Valha a
pena, à semelhança de Joaquim Manuel de Macedo em seu - Um passeio pela cidade
do Rio de Janeiro – termos um pouso, no caso, o Instituto Histórico Geográfico
Brasileiro, seja para melhor conhecermos a circunstância da comissão acima, mas
particularmente atentarmos para a origem da geografia enquanto disciplina no
Brasil.
Conclusão
A esse
tempo, 1838, não havia geografia brasileira porque simplesmente não havia
Brasil.
Esta idéia Brasil, que nos parece
tão natural, com limites, árvores e mapas, não existia ainda a
este tempo. Havia algo que não tinha bandeira, não tinha hino. Não tinha moeda
própria, não tinha partido próprio, enfim, era algo sem projeto, assim, como
esperar daqueles que se debruçavam de nossa realidade tivessem clarividência de
que o
Brasil viria a existir, e não um Brasil todo dividido tal como ocorreu com a
América Espanhola!
Vamos ao IHGB, que é justamente uma
tentativa de ser o espelho deste país.
Por ora, podemos afirmar que a
geografia de sala de aula apresentava pouca serventia. Seja para os alunos,
para os professores, para o Estado, para o Exército... Tudo isto ao menos na
primeira metade do século XIX!
Enfim, o texto começa de um modo e
termina de outro. Vale a pena continuarmos a investigação ...
onde começa a geografia brasileira?
Se alguém lê esta
linhas com um sorriso irônico por já deter a resposta, sinceramente, faço
minha a máxima do poeta florentino: Segue il tuo corso, e lascia dir le genti!
Fontes de dados
Bibliografia
ALI, M. Said. Compedio de geografia elementar. s/d (obra rara) acervo Nucleo de Documentação e Memória do colégio Pedro II – NUDOM.
CALÓGERAS, J. Pandiá . Formação histórica do Brasil. 8ª edição. São Paulo: Ed. Nacional, 1980.
CARVALHO, Delgado . O atlântico sul. 1922. s/d (obra rara) acervo Nucleo de Documentação e Memória do colégio Pedro II – NUDOM.
CARVALHO, José Murilo de . A construção da ordem: a elite imperial. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1981.
DORIA, Escragnole – Memória histórica do colégio de Pedro Segundo (1837-1937). Comissão de atualização da memória histórica do colégio Pedro II, Brasília: Instituto Nacional de Estudo e Pesquisa Educacional, 1991.
FREYRE, Gilberto. Ordem e progresso. Rio de Janeiro: Ed. Record, 2000.
KURY, Lorelai (org.) – Comissão científica do império. Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estudio Editorial Ltda. 2009.
LIMA, Oliveira. Formação histórica da nacionalidade brasileira. 3ª edição. Rio de Janeiro: Topbooks ; São Paulo: Publifolha, 2000.
MACEDO, Joaquim Manuel
de Macedo. Livros de corografia do Brasil. Rio de
Janeiro, livraria Garnier, 1877, 1
e 2 vol. (obra rara) acervo Nucleo de Documentação e
Memória do colégio Pedro II – NUDOM.
_________ Um passeio pela cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1966.
MATTOS, Ilmar Rohloff de . O tempo de saquarema. A formação do estado imperial. Rio de Janeiro: Access, 1994.
ROCHA, Genylton Odilon Rego da Rocha. A trajetória da disciplina geografia no currículo escolar brasileiro (1837-1942). Dissertação de mestrado orientada por Ana Maria Saul e defendida no programa de pós-graduação em educação na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1996.
SANTOS, Arnaldo Ferreira dos Santos. Reminiscências de um ex-aluno do colégio Pedro II, de um médico da UFRJ nascido no morro do Alemão. “Peitudo Caburé”. Rio de Janeiro: Ed. Achiamé, 2007.
SCHWARCZ, Lilia Moritz
. As barbas do imperador. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.
Documentos
Núcleo de Documentação e Memória do colégio Pedro II – NUDOM
Programa de ensino da escola secundária brasileira (1850-1951). Orgs. Anclê Vechic & Karl Michael Lorenz . Ed. Do autor.
Decreto de fundação do colégio Pedro II. Colégio Pedro II, Anuário do Colégio Pedro II. Rio de Janerio, Typ. Revista dos tribunais, 1914, 314 p. , PP. 44-5.
[1] Prof. Dr. do Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense. Email – helioevangelista@hotmail.com
[2] Obra publicada pelo autor nos anos de 1862-1863, e editada pela editora Edições de Ouro em 1966). Sendo ele também ao tempo da primeira publicação professor do Colégio Pedro II. Seu trabalho mais conhecido ficou conhecido como – A moreninha.
[3] A caracterização do Seminário dedicado a órfãos que veio a ser substituído pelo colégio foi exaustivamente realizada pelo referido autor nas seguintes páginas de sua obra p. 235-261. Trata-se de um seminário cuja história remonta à primeira metade do século XVIII.
[4] As observações que se seguem
foram encontradas na obra – Comissão científica do Império – organizada por Lorelai Kury (2009).